
NO VELHO TRIÂNGULO MINEIRO...
(Por Luís Estevam)
Há dois séculos o Triângulo Mineiro não existia.
Aquela região era conhecida apenas como sertão da Farinha Podre e ainda
pertencia a Goiás. Durante um longo tempo, Catalão era o núcleo populacional
mais evoluído de todo o imenso território e mantinha estreitas relações com as
terras do além Paranaíba.
Vale a pena revisitar os episódios passados. Quando
Anhanguera Filho cruzou o rio Grande, vindo de São Paulo, em 1722, ingressou no
sertão da Farinha Podre e tudo virou Goiás. O território era enorme, quando se
tornou província independente, compreendendo mais de dois mil quilômetros de
extensão. Ao norte, começava na divisa com o Maranhão e o Pará. Ao sul,
limitava com a província de São Paulo, tendo o rio Grande como fronteira
meridional.

No entanto, essa privilegiada condição geográfica
durou apenas um século. Em 1830, os criadores de gado na região de Araxá
entraram com um pedido de anexação do sertão da Farinha Podre à província de
Minas Gerais, onde os impostos cobrados sobre a pecuária eram bem menores do
que os exigidos em Goiás. Antes de tal decisão, os invernistas haviam
solicitado ao presidente da província de Goiás a redução das alíquotas sobre o
gado, mas não obtiveram êxito.
Dom Pedro I, então, deu ganho de causa aos
fazendeiros de Araxá e o imenso território da Farinha Podre foi anexado a Minas
Gerais por decreto imperial. Goiás não teve nem chance de entrar com recurso
contra a decisão porque Dom Pedro I abdicou do trono em 1831 e partiu para
Portugal. Levou consigo grande parte da corte, jóias, ouro acumulado e a
maldição das autoridades goianas em função da nefasta partilha territorial.
Curiosamente o imperador não teve vida longa. Vitimado por temível doença,
faleceu em 1834, em Queluz, com apenas 35 anos de idade.

O antigo sertão da Farinha Podre foi batizado, pelos criadores de gado, como Triângulo Mineiro. Diferentemente do restante de Minas Gerais, os moradores da região não se dedicaram à extração do ouro.

Voltaram-se para o comércio e para a criação de bovinos de raça. Uberaba se desenvolveu como a terra do zebu e Uberlândia se tornou o maior centro mercantil do Brasil Central.
Araguari, por sua vez, sediou a ferrovia Mogiana e,
logo depois, a própria estrada de ferro Goiás. Tornou-se uma região muito rica.
A renda do Triângulo, no início do século passado, era maior do que a de muitas
províncias brasileiras e subordinou vários municípios vizinhos. Praticamente
tudo em Catalão era adquirido nas cidades do Triângulo, para onde escoava a
produção regional.
As relações de Catalão com o Triângulo Mineiro, ao
longo da história, foram muito estreitas. Primeiro, o além Paranaíba era
esconderijo de fugitivos da justiça goiana. Quando ocorria um delito em
Catalão, as autoridades comunicavam de imediato o destacamento policial de Araguari
na tentativa de cercar o criminoso.
Porém, os nexos eram bem mais amplos. Jornais que circulavam em Catalão eram feitos em parceria com a imprensa triangulina como, por exemplo, o
"Goiás e Minas"
no início do século passado. Outra
forte dependência se dava através do crédito. O único banco existente na região
era o Banco de Crédito Real de Uberaba, fundado em 1908, antes que surgisse o
poderoso Banco do Triângulo Mineiro em 1935.
Também na educação e na saúde, Catalão dependia do
Triângulo. Quando não existia curso secundário por aqui, as famílias catalanas,
de melhor condição financeira, enviavam os filhos para estudar em Araguari e
Uberaba. Além do que, muitos catalanos nasceram na Santa Casa de Misericórdia
de Araguari, em funcionamento desde 1914.

Catalão não tinha casa de saúde até a metade do
século passado. O primeiro hospital da cidade foi construído pelo imigrante
árabe, Nasr Fayad, somente em 1958. Logo, no ano seguinte, foi inaugurada a
Santa Casa de Catalão, dotando o município de amplos recursos hospitalares.
Antes disso, porém, os feridos e as mulheres
grávidas com recomendação de cesariana , tinham de ser transportados para a
Santa Casa de Araguari. A viagem era um suplício. Mesmo em automóvel
particular, levava em torno de seis horas.
Antigamente para cruzar o Paranaíba haviam duas
opções. Uma estradinha levava ao Porto Velho, situado a montante do rio, e
outra se dirigia ao Porto do Lalau, a jusante do Paranaíba. Ambas exigiam
demorada travessia, antes de se encontrarem na íngreme serra da Bocaima.
O Porto Velho ganhou esse nome ao ser utilizado pelo bandeirante Anhanguera na sua primeira expedição. Já o Porto do Lalau, mais recente, era de propriedade de Ladislau Alcântara, conhecido pela forma simplificada de Lalau. Interessante que, a alcunha se eternizou entre os descendentes de Ladislau, que formaram conhecidos ramos familiares, como o de
- Zé Lalau,
- Prata Lalau,
- Joaquim Lalau
- e Jorge Lalau,
entre outros.
Verdade que, o deslocamento para Araguari foi amenizado com a construção da estrada de ferro. Na ponte ferroviária, em Anhanguera, instalaram um assoalho de madeira para que outros veículos pudessem cruzar o rio além das locomotivas. Ainda assim, a viagem pela estrada de terra era árdua e difícil. Passava por
- Goiandira,
- Cumari,
- Anhanguera,
atravessava a
ponte da ferrovia e ingressava no caminho esburacado e pedregoso da serra da
Bocaima, antes de atingir Araguari. Somente no início da década de 1960 foram
construídas a BR-050 e a ponte Estelita Campos.
Importa saber que, antes da decisão de se construir Goiânia, Catalão era uma cidade populosa e progressista. Quem sabe, se o Triângulo Mineiro continuasse a pertencer a Goiás, a localização geográfica de Catalão estaria privilegiada, bem na área central do território. Seria, tudo indica, uma boa opção para se tornar a capital de Goiás. (Luís Estevam)
Fonte:
Esta matéria é em oferecimento de:
FOLHA DE CATALÃO – A NOTÍCIA
DE FORMA DIRETA
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